A discussão sobre uma possível retomada do auxílio emergencial em 2021 ganhou fôlego nesta semana, após o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e o ministro da Economia, Paulo Guedes, admitirem a possibilidade de recriação do benefício, depois de meses de negação.
Também o novo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG),
disse ter "expectativa positiva" de um anúncio ainda nesta semana.
A extensão do auxílio está sendo discutida diante do avanço
do número de casos e mortes por covid-19 desde o fim do ano passado, que deve
postergar a recuperação da economia e do mercado de trabalho. Segundo cálculos
do economista Naércio Menezes, do Insper, o fim do auxílio em dezembro já
empurrou mais de 2 milhões de brasileiros à pobreza neste início de ano,
conforme reportou o G1.
A proposta oficial do governo ainda é desconhecida, mas o
mercado já reage negativamente à hipótese de uma nova despesa ser criada fora
do teto de gastos e sem cortes de outros desembolsos como contrapartida.
Nesta terça-feira (9/2), o dólar fechou em alta de 0,19%,
cotado a R$ 5,383, após dois dias de queda. Ao longo do dia, a moeda americana
bateu em R$ 5,447, mas perdeu força após o Banco Central intervir no mercado para
conter a valorização. Já o Ibovespa, principal índice de ações da bolsa
brasileira, fechou em queda de 0,19%, após recuar 1,21% na mínima do dia.
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Também nesta terça, o presidente do Banco Central, Roberto
Campos Neto, indicou que uma nova rodada do auxílio sem compensações pode
resultar em alta da taxa básica de juros, que está atualmente na mínima
histórica de 2% ao ano.
"Sem nenhuma contrapartida, há um risco de adotar uma
medida para estimular a economia e ter um efeito negativo", disse Campos
Neto, durante evento online voltado a investidores internacionais. "Porque
estamos em um ponto de inflexão, no qual o que o mercado está nos dizendo é
que, se só gastarmos mais, a reação das variáveis à fragilidade na situação
fiscal vai superar o benefício de colocar mais recursos na economia."
Perguntas a serem respondidas pelo governo
"Há uma dúvida quanto ao desenho, ou seja, qual é o
tamanho e quem deve receber essa nova rodada do auxílio, e quanto à
operacionalização do ponto de vista orçamentário", diz Daniel Couri,
diretor da IFI (Instituição Fiscal Independente) do Senado Federal.
Quanto a esse segundo ponto, diz Couri, as duas posições em
debate são se essa despesa adicional será feita dentro ou fora do teto de
gastos.
"É possível defender as duas interpretações",
afirma o economista. "Por um lado, é verdade que há uma situação de
pandemia e de exceção já desde o ano passado, então já se sabia que seria
necessário gastar. Por outro lado, a magnitude da pandemia não era conhecida,
então não é porque virou o ano que ela deixou de ser uma situação calamitosa e
extraordinária."
Para Couri, apesar de os dois caminhos serem justificáveis,
a abertura de um crédito extraordinário extra teto via Medida Provisória seria
o mais rápido para viabilizar o pagamento a quem necessita.
"O caminho do crédito extraordinário é mais rápido,
porque você não precisa indicar a fonte dos recursos, você pode emitir títulos,
por exemplo, e pagar com dívida", diz o diretor da IFI.
"No caminho da compensação, de fazer essa despesa
entrar dentro do teto, você precisa indicar onde vai cortar. O primeiro
problema aí é que isso pode tornar o pagamento do auxílio mais demorado, porque
será preciso achar essa fonte. O segundo problema é que essas fontes estão
escassas, tem talvez alguns bilhões dentro das despesas discricionárias e você
pode, claro, revisitar algumas despesas obrigatórias, mas aí é ainda mais
difícil."
Despesas discricionárias são aquelas sobre as quais o
governo tem algum poder de decisão, diferentemente das obrigatórias. No PLDO
(Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2021, essas despesas somam R$
83,9 bilhões, ou apenas 5,4% do Orçamento total de R$ 1,55 trilhão.
'Cláusula
de calamidade'
Na semana passada, ao falar sobre a possibilidade de
retomada do auxílio em formato mais enxuto e para metade dos beneficiários - já
que a outra metade recebe Bolsa Família -, o ministro Paulo Guedes disse que
isso só seria possível "dentro de um novo marco fiscal" e "se
dispararmos as cláusulas necessárias".
Conforme o portal G1, o secretário de Tesouro Nacional,
Bruno Funchal, explicou na sexta-feira (5/2) que a cláusula a que Guedes se
referia deve ser incluída na PEC (Proposta de Emenda à Constituição) do Pacto
Federativo.
Auxílio
atrelado a curso de formação
No domingo (7/2), a Folha de S. Paulo reportou, com base em
informações de bastidores, que o Ministério da Economia estaria trabalhando
numa proposta de retomada do auxílio com o pagamento de três parcelas no valor
de R$ 200, com foco em trabalhadores informais não beneficiários do Bolsa
Família.
Conforme o jornal, a assistência teria o nome de BIP (Bônus
de Inclusão Produtiva) e, para receber o auxílio, o beneficiário teria que
participar de um curso para qualificação profissional.
"Parece não fazer muito sentido", avalia Couri, da
IFI, sobre a exigência de curso de formação. "O auxílio se justifica
justamente por uma dificuldade que ainda existe no mercado de trabalho. Então
as pessoas vão se capacitar para um mercado que não está aquecido",
afirma.
"Além disso, está sendo imposto um custo à pessoa, de
ou ter internet para fazer um curso virtual ou se locomover até o local do
curso. Não parece estar de acordo com a natureza de um auxílio emergencial e
temporário. Afinal, são três parcelas. Quem vai se capacitar em três meses?",
questiona o economista.
A consultora Zeina Latif, por sua vez, avalia que faz
sentido requalificar trabalhadores, diante de um mercado de trabalho que será
diferente no pós-pandemia, exigindo novas habilidades dos profissionais. Mas,
segundo ela, "o diabo mora nos detalhes".
"O que foi estudado para se implementar isso? E o que exatamente quer se implementar? Uma coisa é você fazer um grande enunciado, outra coisa é por no papel uma política pública que faça sentido, que seja factível e à qual as pessoas vão ter acesso de fato", afirma.